terça-feira, 28 de junho de 2011

Peluso fala.

Ministro do STF Cezar Peluso
O Presidente do STF, Ministro Cezar Peluso, tem sido constantemente alvo do noticiário, sua última e mais controvertida idéia foi da PEC dos Recursos, não obstante as críticas que a proposta possa receber, uma coisa é certa, o atual presidente da mais alta Corte de Justiça do país foi precursor de uma nova era do Judiciário, uma era que tem como principal característica a "popularização" do STF.
A omissão do Poder Legislativo, bem como o amadurecimento social tem levado o STF a debater temas de profundo interesse e apelo popular e social, que o diga os julgamentos sobre a chamada Lei da Ficha Limpa, e de igualdade de direito aos casais homoafetivos.
Vejo com muita satisfação todo esse processo, apesar de achar que está havendo certa usurpação da competência do Poder Legislativo, a mesma ocorre pela ausência de disposição política deste poder para enfrentar temas polêmicos, o STF tem sido responsável pela aproximação da população com o Direito, e, um povo consciente de seus direitos, é um povo propenso ao desenvolvimento.
Transcrevo entrevista que o ministro Cezar Peluso concedeu ao repórter Felipe Seligman da Folha de S. Paulo; apesar de curta, ela demonstra claramente a personalidade franca e sem temor do magistrado.
Minsitro Peluso, apesar de dircordar de alguns pontos de vista de V.Exa., reconheço sua grande contribuição ao Judiciário.

Folha — Outros ministros do Supremo ficaram desconfortáveis com sua proposta para que os recursos percam o efeito suspensivo após a segunda instância. O senhor chegou a consultá-los?
Cezar Peluso — Por escrito. Mandei o texto para eles, pedindo sugestão. O único que respondeu, embora discordando, foi o ministro Marco Aurélio. Jamais usei o nome do Supremo para defender essa PEC [Proposta de Emenda à Constituição], que é de caráter pessoal.
Folha — O que o senhor acha que aconteceria se, após aprovada, ela fosse questionada no STF?
Cezar Peluso — Isso não sabemos. Mas não tenho nenhum receio.
Folha — O senhor acredita que os tribunais estão preparados para essa responsabilidade?
Cezar Peluso — Os tribunais hoje têm potencialidade de responder a essa expectativa. A tarefa deles será facilitada pelo maior cuidado com que as partes vão cuidar de suas causas. A sociedade vai ficar de olho nos tribunais, mais que hoje.
Folha — O processo do mensalão no Supremo está célere?
Cezar Peluso — É o processo mais complexo que o STF teve. São quase 40 réus, com advogados diferentes. Só para a sustentação oral, cada um deles pode gastar uma hora. Isso significa que, só de sustentação oral de advogados, teremos 40 horas no mínimo.
Folha — Há risco de alguém se livrar de uma eventual condenação por prescrição?Cezar Peluso — Acho que o ministro relator está muito atento a isso. Se ele tivesse vislumbrado algum risco, já teria antecipado alguma coisa. Ele está conduzindo com a tranquilidade de quem não está correndo risco de prescrição.
Folha — Mas advogados estão fazendo de tudo isso ocorrer, não?Cezar Peluso — Os advogados lançam mão de todos os expedientes e recursos permitidos.
Folha — E isso é válido?
Cezar Peluso — Se o sistema permite, o advogado que não usa pode ser acusado de negligência.
Folha — Pouco antes de assumir a presidência, o senhor afirmou que defenderia a redução das férias dos juízes, de 60 para 30 dias. O que aconteceu?
Cezar Peluso — Já fui ao Senado, já respondi em audiência pública sobre isso. Tem um projeto que está lá para ser analisado.
Folha — Sua posição continua igual?
Cezar Peluso — A mesma. Eu acho que o juiz brasileiro trabalha muito. Acontece que a sociedade hoje é tal que soa como um privilégio [as férias de 60 dias] e isso não é bom para o prestígio da magistratura. Eu acho que férias de 30 dias é o ideal. Mas, pensando sobretudo nos advogados sugiro que haja 30 dias de férias para o juiz e, para todos, tem que haver um período de recesso onde os próprios advogados possam ter férias.
Folha — Quanto tempo de recesso?
Cezar Peluso — De 20 dias seria ótimo, 20 de dezembro a 10 de janeiro.
Folha — Um juiz goiano anulou a união de um casal gay e criticou a decisão do STF. Como o sr. vê essa decisão?
Cezar Peluso — Como tese, as decisões que pela Constituição são vinculantes têm que ser observadas pelo juiz. O que os juízes podem fazer é dizer: "Não concordo com a decisão do Supremo porque não acredito que foi a melhor interpretação, mas sou obrigado a cumprir, portanto aplico". A crítica intelectual é válida. As decisões de qualquer tribunal são sujeitas à crítica. Mas, no plano da obrigatoriedade, não pode haver discussão.
Folha — Sobre a marcha da maconha, o STF não entrou no mérito da discussão. O sr. acredita que a discussão deve ocorrer?
Cezar Peluso — Sim, é uma discussão velha. Há mais de 20 anos, eu estive num simpósio onde vi acadêmicos sustentarem que a melhor maneira de combater o tráfico de entorpecente seria a liberação do seu uso.
Folha — O sr. concorda?
Cezar Peluso — Não sou capaz de dizer se isso é uma coisa ruim ou boa. Precisa ser estudado com muito cuidado.
Folha — O sr. já teve contato com maconha?
Cezar Peluso — Vou lhe contar uma experiência para te dizer que nunca tive. Uma vez na PUC me disseram: "Professor, o sr. passou ali no meio agora pouco, não viu dois caras fumando, lá?". Eu falei: "Vi dois caras fumando, sim". Aí disseram: "O sr. não sentiu cheiro de maconha?". E eu respondi: "Nem sei qual é o cheiro da maconha" [risos].
Folha — O ministro Celso de Mello defendeu a discussão sobre legalização da maconha para fim religioso. O sr. concorda?
Cezar Peluso — Tenho minhas ressalvas, o uso religioso pode ser a aparência. Seria uma bela maneira de contornar lei.
Folha — O sr. propôs que haja reuniões fechadas entre os ministros do STF para discutir julgamentos. Por quê?
Cezar Peluso — Essa possibilidade de discussões prévias, de trocas de ponto de vistas num ambiente mais informal, sem assistência, sem público, ajudaria muito. Uma coisa é eu estar conversando com você. Outra coisa é eu estar no Pacaembu e todo mundo ver o que estamos conversando. Seriam reuniões preparatórias, que não são incompatíveis com a Constituição.
Folha — O que precisa ser feito na prática para isso acontecer?
Cezar Peluso — Simplesmente que a gente concorde em criar uma emenda regimental que permita sessões reservadas preparatórias de decisões administrativas e jurisdicionais. Nada se vai decidir ali. Serão apenas troca de ideias, preparar uma decisão futura.
Folha — Poderia ter evitado o impasse sobre a Lei do Ficha Limpa?
Cezar Peluso — Poderia ter evitado um monte de coisa.
Folha — O que sr. pensa sobre o sigilo eterno de documentos?
Cezar Peluso — É uma questão delicadíssima, que deve ser decidida pelo Legislativo e pelo Executivo. Mas há certos dados sigilosos que podem pôr em risco a segurança do Estado, que tem o direito de preservar sua segurança e não trocá-la pela pretensão da mera divulgação. O problema é que não apenas o povo fica sabendo tudo, mas os inimigos do Poder e do país também. Isto pode botar em risco a segurança. Tanto o Executivo quanto o Legislativo têm que lidar com tranquilidade, procurando compatibilizar a aspiração legítima da sociedade e a preservação daquilo que seja essencial

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