quarta-feira, 4 de julho de 2018

Mansplaining - ponto de partida da violência contra a mulher.


Rebecca Solnit começa o brilhante Os Homens Explicam Tudo Para Mim narrando experiência pessoal em que, ao dialogar com um homem mais velho, imponente, rico e distinto, ouviu comentário de que havia ouvido falar sobre dois livros de sua autoria, solicitando que falasse sobre os mesmos, neste momento a autora começou a relatar sobre seu último – Rio das Sombras: Eadweard Muybridge e o Faroeste Tecnológico; ao citar Muybridge, foi de pronto interrompida pelo interlocutor, que indagou se já tinha ouvido falar de um livro muito importante editado naquele ano sobre Muybridge, passando de pronto a comentar sobre a edição, afirmando, inclusive que ela tinha que conhecer; a prelação só findou quando a amiga, pela terceira vez, interviu e afirmou que era o livro DELA.

O senhor então calou-se e empalideceu, continuando a falar pouco tempo depois, incessantemente; as interlocutoras educadamente ouviram até o final e somente riram do episódio quando não mais estavam na presença do embaraçado homem.

O termo mansplaining foi cunhado logo após a publicação de seu livro, recebendo a autora o crédito por ser a inventora.

O livro prossegue falando sobre a violência contra a mulher, Rebecca ver os frequentes episódios de estupros coletivos, assassinatos, não como casos isolados e sim um padrão se repetindo, uma violação de direitos civis ou humanos, não tem raça, classe, religião, nacionalidade, tem gênero.

Após dois terços do livro lido, me flagro questionando que o tema central do livro, hoje difundido como mansplaining – termo que por sinal a autora reluta em utilizar, por motivo que nesse breve escrito não é pertinente citar -, é deixado de lado, passando a violência contra a mulher nas mais diversas formas a ser discutido.

Quase ao final dessa leitura deliciosa, identifico que o meu questionamento foi compartilhado pela autora, que brilhantemente explica a causa dessa suposta mudança de tema, é que nós tendemos a tratar a violência e o abuso de poder como se as duas coisas estivessem em categorias hermeticamente fechadas: assédio, intimidação, espancamento, estupro, assassinato; porém Rebecca identificou que o que pretendeu dizer é que essas coisas quando começam vão escorregando ladeira abaixo, o importante é encarar a ladeira ao invés de colocar em compartimentos estanques as diversas variedades de misoginia.

Um homem age com a convicção de que nós, mulheres, não temos o direito de falar, nem de definir o que está acontecendo, assim, pode significar apenas interromper sua fala, mandar calar a boca, ameaçá-la caso abra a boca, bater em você por ter falado, ou matá-la para nos silenciar para sempre.
Pode ser o irmão, o marido, o chefe, um estranho, alguém que você nunca viu e que está com raiva de alguma outra pessoa, mas julga que “as mulheres” constituem uma categoria tão pequena que você pode substituir esta por “aquela”. Ele está ali para lhe dizer que você não tem direitos.

O livro é um despertar, nos joga na cara o que lidamos na vida, umas com mais frequência que outras, nos mostra que não estamos solitárias nessa luta constante para podermos ser e existir.

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