terça-feira, 31 de julho de 2018

Tratamento Legal do Assédio Sexual na França

O governo da França endureceu o combate contra a violência sexual e sexista com um projeto de lei que reforça a penalização dessas agressões, amplia seu prazo de prescrição e fixa em 15 anos a idade mínima de consentimento para ter relações.
A conhecida como Lei Schiappa, em homenagem à secretária de Estado que a impulsionou, aumenta de 20 a 30 anos a prescrição dos crimes, principalmente sexuais, contra menores, um tempo adicional que se dá às vítimas levando em conta a chamada “amnésia traumática”, frequente nesse tipo de agressões.
A nova legislação, cria também uma nova infração de “ofensa sexista”, que permitirá às forças da ordem penalizar comentários inadequados.
Os infratores deverão pagar de 90 até 750 euros, 1.500 se houver circunstâncias agravantes, e 3.000 se forem reincidentes, quantias que querem sancionar esse tipo de comportamento e servir de arma dissuasória.
Outro dos seus artigos reforça a penalização das agressões sexuais ao estabelecer que toda penetração sexual em um menor de 15 anos constituirá um crime de agressão sexual.
O Executivo ampliou ainda a definição de assédio na internet para que se castiguem os casos nos quais se atua em grupo, mesmo que uma das pessoas não tenha participado do mesmo de forma repetida.
O projeto de lei cumpre algumas das promessas de campanha do presidente, Emmanuel Macron, e chega cinco meses depois da explosão do escândalo de abusos sexuais protagonizados pelo produtor americano Harvey Weinstein, que teve ampla repercussão na França.
O objetivo, segundo explicou hoje a Secretário de Estado de Igualdade, Marlène Schiappa, é que não exista no país um “espaço sem lei” no relativo ao assédio e se condene “melhor” essas agressões.
A ação do governo se situa na linha do exigido pela sociedade francesa: nove de cada dez franceses aprovam elevar a 30 anos a prescrição dos estupros a menores, segundo uma pesquisa divulgada hoje pelo instituto Ifop, e essa mesma porcentagem é favorável a sancionar o assédio nas ruas.
Oposição: 
No início dos debates, 250 pessoas, incluindo personalidades francesas como a atriz Karin Viard, assinaram uma carta aberta ao presidente Emmanuel Macron pedindo a retirada do artigo 2 do projeto de lei sobre as violências sexuais. "Estamos preocupados", afirmou o grupo, que também conta com o apoio de Yvette Roudy, ex-ministra dos direitos das mulheres (1981-1986). A iniciativa é do Groupe F, movimento feminista liderado pela militante Caroline De Haas.
Na carta, o grupo diz também não querer ver "outro Pontoise", em referência ao caso de um homem que compareceu ao tribunal regional da cidade de Pontoise, na região parisiense, acusado de ter tido uma relação sexual com uma menina de 11 anos. A justiça francesa considerou que a garota havia consentido o ato, uma decisão que chocou a opinião pública.
Na França, a presunção de inocência do acusado é absoluta. Com isso, caso não se consiga provar a falta de consentimento do menor, o ato deixa de ser considerado como um estupro e passa a ser julgado como uma agressão sexual. Enquanto o primeiro é julgado por um júri popular, com penas podendo chegar a 20 anos de prisão, o segundo passa por um tribunal de primeira instância, com penas menores e a decisão de apenas um juiz.
No Brasil, a justiça desconsidera a noção de consentimento quando o crime é cometido contra menores de 14 anos. Em um processo parecido com o de Pontoise, o ministro Nefi Cordeiro, do Superior Tribunal de Justiça, condenou, em 2017, um homem pelo estupro de uma menina de 12 anos, com a qual manteve um relacionamento amoroso. "O consentimento da vítima, sua eventual experiência sexual anterior ou a existência de relacionamento amoroso entre o agente e a vítima não afastam a ocorrência do crime", declarou o ministro.
O artigo 2 do novo projeto de lei quer inserir a interpretação usada pela lei brasileira, mas, no entanto, sem considerar o ato como sendo um estupro. O texto prevê que "quando os fatos forem cometidos contra menores de 15 anos, as noções de constrangimento e violência, que constituem a agressão sexual, podem ser consideradas como abuso de vulnerabilidade da vítima que não possui discernimento necessário para consentir a relação sexual". O texto também dobra a pena, de 5 para 10 anos de prisão, quando houver agressão sexual "com penetração", nos casos onde o estupro não for comprovado.
Com a criação desse "novo delito de abuso sexual 'com penetração' em menores, passível de 10 anos de prisão, a lei irá levar muitos juízes a desconsiderar o estupro e teremos uma maioria de casos julgados em primeira instância, com penas menores" afirma a militante feminista Caroline De Haas.
Situação atual da nova legislação:
Espera-se que nesta semana seja aprovada a nova lei.
Fonte: Agência Francesa de Comunicação, BBC Brasil.

segunda-feira, 30 de julho de 2018

Lei Maria da Pennha

Maria da Penha é uma farmacêutica brasileira, natural do Ceará, que sofreu constantes agressões por parte do marido.
Em 1983, seu esposo tentou matá-la com um tiro de espingarda. Apesar de ter escapado da morte, ele a deixou paraplégica. Quando, finalmente, voltou à casa, sofreu nova tentativa de assassinato, pois o marido tentou eletrocutá-la.
Quando criou coragem para denunciar seu agressor, Maria da Penha se deparou com uma situação que muitas mulheres enfrentavam neste caso: incredulidade por parte da Justiça brasileira.
Por sua parte, a defesa do agressor sempre alegava irregularidades no processo e o suspeito aguardava o julgamento em liberdade.
Em 1994, Maria da Penha lança o livro “Sobrevivi...posso contar” onde narra as violências sofridas por ela e pelas três filhas.
Da mesma forma, resolve acionar o Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) e o Comitê Latino Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (CLADEM).
Estes organismos encaminham seu caso para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), em 1998.
O caso de Maria da Penha só foi solucionado em 2002 quando o Estado brasileiro foi condenado por omissão e negligência pela Corte Interamericana de Direitos Humanos.
Desta maneira, o Brasil teve que se comprometer em reformular suas leis e políticas em relação à violência doméstica.
Anos depois de ter entrado em vigor, a lei Maria da Penha pode ser considerada um sucesso. Apenas 2% dos brasileiros nunca ouviram falar desta lei e houve um aumento de 86% de denúncias de violência familiar e doméstica após sua criação.
Para ajudar as vítimas de violência, o governo disponibilizou o número 180 no qual a pessoa que se sente vítima de violência pode denunciar seu agressor.
Igualmente, instituiu as Casa da Mulher Brasileira com o objetivo específico de acolher a mulher que não tem para onde ir.
Apesar do sucesso da Lei Maria da Penha, as estatísticas da violência contra a mulher no Brasil continuam altas. 
Fonte: UFBA
Site do Senado Federal fornece um panorama por Estado.
http://www.senado.gov.br/institucional/datasenado/omv/indicadores/relatorios/BR.pdf

terça-feira, 24 de julho de 2018

Nigéria proíbe mutilação genital feminina



A mutilação genital feminina na Nigéria é um tema que está em voga há algum tempo. De um lado estão os defensores a manutenção de tradições. Do outro mulheres e pessoas que acreditam na importância de cessar práticas machistas.Em meio ao cenário de debate, o presidente Goodluck Jonathan aprovou criminalização da mutilação genital feminina na Nigéria. Considerado o último ato de seu mandato, já que Jonathan foi derrotado no pleito eleitoral por Muhammadu Buhari, a lei federal representa uma mudança de postura do país da África Ocidental.
A medida, que também prevê punição aos homens que abandonarem suas mulheres e filhos, vai contribuir para a diminuição deste hábito mutilatório. De acordo com levantamento feito por entidades de defesa dos direitos humanos, a mutilação feminina atingiu 25% das mulheres nigerianas entre 15 e 49 anos. A ONU revelou em 2014 que o ato gera infertilidade, perda do prazer sexual, além de oferecer risco de morte causado por possíveis infecções.
Cercada por um debate que envolve tradição, mas também direito ao próprio corpo, a proibição da mutilação feminina traduz uma mudança oriunda do desenvolvimento social. Não se trata de um fim aos costumes tradicionais, mas de uma adequação aos tempos modernos.
“É crucial que continuemos com os esforços de mudanças de visões culturais que permitem a violência contra a mulher. Só assim esta prática agressiva terá um fim”, declarou ao The Guardian Stella Mukasa, diretora do núcleo de Gênero, Violência e Direitos do Centro de Pesquisas da Mulher.
O caminho é para frente, passos largos e as vezes curtos, mas a luta pra alcançar a igualdade de gênero prossegue. Mulheres unidas em luta pela causa feminina.

Fonte: ONG Geledés.

quarta-feira, 4 de julho de 2018

Mansplaining - ponto de partida da violência contra a mulher.


Rebecca Solnit começa o brilhante Os Homens Explicam Tudo Para Mim narrando experiência pessoal em que, ao dialogar com um homem mais velho, imponente, rico e distinto, ouviu comentário de que havia ouvido falar sobre dois livros de sua autoria, solicitando que falasse sobre os mesmos, neste momento a autora começou a relatar sobre seu último – Rio das Sombras: Eadweard Muybridge e o Faroeste Tecnológico; ao citar Muybridge, foi de pronto interrompida pelo interlocutor, que indagou se já tinha ouvido falar de um livro muito importante editado naquele ano sobre Muybridge, passando de pronto a comentar sobre a edição, afirmando, inclusive que ela tinha que conhecer; a prelação só findou quando a amiga, pela terceira vez, interviu e afirmou que era o livro DELA.

O senhor então calou-se e empalideceu, continuando a falar pouco tempo depois, incessantemente; as interlocutoras educadamente ouviram até o final e somente riram do episódio quando não mais estavam na presença do embaraçado homem.

O termo mansplaining foi cunhado logo após a publicação de seu livro, recebendo a autora o crédito por ser a inventora.

O livro prossegue falando sobre a violência contra a mulher, Rebecca ver os frequentes episódios de estupros coletivos, assassinatos, não como casos isolados e sim um padrão se repetindo, uma violação de direitos civis ou humanos, não tem raça, classe, religião, nacionalidade, tem gênero.

Após dois terços do livro lido, me flagro questionando que o tema central do livro, hoje difundido como mansplaining – termo que por sinal a autora reluta em utilizar, por motivo que nesse breve escrito não é pertinente citar -, é deixado de lado, passando a violência contra a mulher nas mais diversas formas a ser discutido.

Quase ao final dessa leitura deliciosa, identifico que o meu questionamento foi compartilhado pela autora, que brilhantemente explica a causa dessa suposta mudança de tema, é que nós tendemos a tratar a violência e o abuso de poder como se as duas coisas estivessem em categorias hermeticamente fechadas: assédio, intimidação, espancamento, estupro, assassinato; porém Rebecca identificou que o que pretendeu dizer é que essas coisas quando começam vão escorregando ladeira abaixo, o importante é encarar a ladeira ao invés de colocar em compartimentos estanques as diversas variedades de misoginia.

Um homem age com a convicção de que nós, mulheres, não temos o direito de falar, nem de definir o que está acontecendo, assim, pode significar apenas interromper sua fala, mandar calar a boca, ameaçá-la caso abra a boca, bater em você por ter falado, ou matá-la para nos silenciar para sempre.
Pode ser o irmão, o marido, o chefe, um estranho, alguém que você nunca viu e que está com raiva de alguma outra pessoa, mas julga que “as mulheres” constituem uma categoria tão pequena que você pode substituir esta por “aquela”. Ele está ali para lhe dizer que você não tem direitos.

O livro é um despertar, nos joga na cara o que lidamos na vida, umas com mais frequência que outras, nos mostra que não estamos solitárias nessa luta constante para podermos ser e existir.